quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

A Biblioteca


Querido Umbigo:

Queria ter um sistema de memória(s) preciso, como um sistema de arquivo das mais avançadas bibliotecas, não queria esta Torre de Babel...

Para onde vão as pessoas que conhecemos e esquecemos, os sonhos desfeitos, as músicas que ouvimos, os filmes que vimos, as peças que assisistímos e que na altura puseram a nossa cabeça a funcionar, o nosso coração a brilhar...

Porque é que não posso remover com precisão cirúrgica as pessoas de que não me quero lembrar, todos os momentos de desconforto, todas as vezes em que me partiram o coração ou em que parti o coração a alguém.

Porque é que não posso esquecer todas as vezes que a confiança foi quebrada?

Se não remover ou eliminar, pelo menos guardar estas memórias num espaço menos nobre da minha biblioteca, como se faz às edições menos ilustres, às traduções menos boas?

Porque é que às vezes de manhã acordo e em vez de me lembrar do fantástico livro que vivi, me lembro das histórias de terror, que nem sequer são o meu género preferido?

Será que isto se resolve se eu deixar de ser bibliotecária de ficções e me dedicar à bem mais precisa arte da cirurgia?

Será que consigo inventar a cirurgia plástica da alma e do coração?

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